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sem medo de errar
Como advogado de Joana, devemos aplicar o que aprendemos sobre os direitos da personalidade.
Para começar, lembre-se de que os direitos da personalidade são aqueles inerentes ao homem e à sua dignidade. Eles possuem algumas características: intransmissíveis, irrenunciáveis, absolutos, extrapatrimoniais, impenhoráveis, inatos e imprescritíveis.
São intransmissíveis, uma vez que não é possível transmitir o seu direito a outra pessoa. São irrenunciáveis, já que a pessoa não pode por ato manifestar o desejo de não exercer esses direitos. São absolutos, pois podem ser opostos contra todas as pessoas. São extrapatrimoniais, visto que não tem valor patrimonial. São impenhoráveis, ou seja, não são passíveis de penhora. São inatos e vitalícios, pois acompanham toda a vida da pessoa. São imprescritíveis, porque o titular não perde o direito de exercê-los no decorrer do tempo.
Contudo, existe uma fatia desses direitos que tem aspectos patrimoniais e, por isso, são disponíveis e renunciáveis, por exemplo, contrato para uso de imagem, como no caso da nossa situação-problema.
É juridicamente possível que Joana firme contrato de publicidade, cedendo sua imagem, como fez em 2001, com a empresa “Bonita”. Entretanto, para firmar esse contrato, existem alguns requisitos essenciais que não podem deixar de ser observados. Vamos lembrar quais são? O ato de renúncia de seu direito não pode ser permanente. Portanto, necessariamente, precisa ter um tempo de duração determinado, não pode ser perpétuo. Ainda, o ato de disposição do direito não pode ser genérico, ou seja, é necessário prever para qual ato específico que se renuncia e, ainda, não pode violar a dignidade do titular.
Considerando o contrato de Joana com a empresa “Bonita” e as características dos direitos da personalidade, o contrato firmado entre as partes não poderá ser ad eternum, uma vez que houve renúncia ao direito da personalidade (imagem) sem prazo de duração específico (houve renúncia eterna), o que não é admitido em nosso ordenamento jurídico. Adicionalmente, a situação-problema nos mostra que o contrato firmado com a empresa “Bonita” acarretou renúncia genérica ao direito da imagem de Joana, sem sequer especificar para quais atos sua imagem seria veiculada, com qual finalidade e, especialmente, sem prazo estipulado – em verdadeira afronta à irrenunciabilidade total e eterna dos direitos da personalidade. Portanto, este contrato não está respeitando os direitos da personalidade de Joana.
Nesse mesmo sentido, a jurisprudência brasileira é firme no entendimento de que o direito individual à imagem não pode ser cedido contratualmente em modo eterno e ilimitado, conforme o Enunciado nº 04, da I Jornada de Direito Civil, art. 11: “O exercício dos direitos da personalidade pode sofrer limitação voluntária, desde que não seja permanente nem geral” (CONSELHO DA JUSTIÇA FEDERAL, 2012, p. 18).
Em outras palavras, existem aspectos patrimoniais dos direitos da personalidade que podem ser destacados ou transmitidos, desde que de forma limitada. Também ilustrando, pode-se dizer que um atleta profissional tem a liberdade de celebrar um contrato com uma empresa de material esportivo, para a exploração patrimonial de sua imagem, como é comum. Entretanto, esse contrato não pode ser vitalício, como ocorre algumas vezes na prática, principalmente em casos de contratos celebrados entre jogadores de futebol brasileiros e empresas multinacionais. Esses contratos, geralmente, são celebrados no estrangeiro, mas se fossem constituídos no Brasil seriam nulos, por ilicitude de seu objeto, pois a cessão de uso dos direitos da personalidade é permanente (art. 166, II, do CC e Enunciado n. 4 do CJF/STJ).
Para a proteção dos direitos de Joana, você, como advogado, deve considerar que a tutela dos direitos da personalidade pode ser preventiva e reparatória. A tutela preventiva tem como objetivo impedir a ocorrência do próprio dano antes que ele ocorra. Já a tutela reparatória busca sancionar e reparar o dano já ocorrido ao direito da personalidade. Todas as espécies de danos devem ser reparadas e podem ser cumuladas com o requerimento de danos materiais, morais e estéticos.
Joana poderá sofrer danos materiais caso, por exemplo, não tenha firmado o contrato com a empresa “Linda”, em decorrência do contrato firmado anteriormente, pois deixará de receber remuneração pelo novo uso de sua imagem. Ainda, poderá sofrer danos morais, caso a empresa “Bonita” tenha utilizado abusivamente da imagem dela, ou se recuse a devolver-lhe o direito de ceder sua imagem para fins publicitários para a outra empresa depois de determinado período.
Assim, para responder à pergunta de Joana, você deve sugerir que ela desfaça o contrato com a empresa “Bonita” e busque a proteção jurídica necessária aos seus direitos e eventuais danos que sofreu em virtude da situação.
Ainda, você deve assegurar que ela poderá firmar novo contrato com a empresa “Linda”, uma vez que o contrato com a empresa “Bonita” violou seus direitos da personalidade, pois a cessão da imagem não pode ocorrer de forma perpétua.