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sem medo de errar
No caso em exame, João Carlos poderá se utilizar do e-mail enviado pela empresa como meio de prova, pois o artigo 212, do Código Civil, é elencado apenas em caráter exemplificativo.
De acordo com o artigo 369, do Código de Processo Civil, dispõe:
Art. 369. As partes têm o direito de empregar todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, para provar a verdade dos fatos em que se funda o pedido ou a defesa e influir eficazmente na convicção do juiz.
Por sua vez, o Código Civil também possui disposição que assegura a juntada de cópias obtidas a partir de meio magnético ou eletrônico. Nesse sentido, dispõe o art. 225, do Código Civil:
Art. 225. As reproduções fotográficas, cinematográficas, os registros fonográficos e, em geral, quaisquer outras reproduções mecânicas ou eletrônicas de fatos ou de coisas fazem prova plena destes, se a parte, contra quem forem exibidos, não lhes impugnar a exatidão.
Assim, conclui-se que João Carlos poderá demonstrar a relação jurídica através do e-mail que foi enviado pela empresa vendedora, e esse documento terá eficácia em juízo, ante os dispositivos legais citados.
Avançando na prática
Prova de quitação em negócio com escritura pública
Evandro estava precisando de forma urgente de dinheiro, para saldar pendências financeiras. Assim, tomou a difícil decisão de vender o seu imóvel. Por esse motivo, ELE anunciou o seu apartamento em um site de vendas de imóveis denominado Zip imóveis. Após algumas semanas, o senhor José Rolo entrou em contato, interessado em adquirir o imóvel. Ele propôs o pagamento do imóvel com uma entrada R$ 400.000,00 (quatrocentos mil reais) e duas prestações de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), valor este que contou com a concordância de Evandro. Contudo, José Rolo fez a ressalva de que, por motivos pessoais, na escritura pública deveria constar um valor inferior de R$ 600.000,00 (seiscentos mil reais), ao que foi contratado, por questões de pagamento de impostos, bem como que já constasse quitação das parcelas pactuadas.
Essa conversa foi presenciada por Rita, corretora de imóveis, e dois colegas de profissão de Evandro.
Confiando no comprador, Evandro determinou ao cartório de notas que lavrasse a escritura na forma pactuada. Na data assinalada, a escritura foi assinada por Evandro e José Rolo. Ocorre que a entrada de R$ 400.000,00, cujo pagamento deveria ocorrer no dia da assinatura da escritura, não foi quitada pelo comprador. Preocupado com a situação, Evandro o procurou, no sentido de receber uma previsão para o pagamento. No entanto, surpreendeu-se com uma resposta dada por José Rolo de que nada devia, pois houve declaração expressa na escritura pública que o imóvel já estaria quitado. Afirmou ainda que havia procurado um advogado, o qual garantiu esse ponto de vista, em razão da presunção de pagamento inserida na escritura pública.
Desesperado e revoltado com a situação, Evandro procurou você em seu escritório, para fazer os seguintes questionamentos: 1. Evandro ficaria impedido de cobrar os valores da compra e venda em juízo ou de fazer a rescisão do negócio, em razão de ter constado a quitação do negócio na escritura pública? 2. Ele poderia, caso deseje manter o negócio e cobrar o valor, cobrar o valor real da negociação ou o valor que constou na escritura pública? 3. Evandro poderia provar o valor real do negócio através das testemunhas que acompanharam o ato da negociação?
Evandro deverá buscar demonstrar nesse processo que será ajuizado que, embora conste na escritura pública que houve os pagamentos, esses valores não adentraram à conta corrente que foi estipulada pelas partes como aquela que forneceria o recibo de pagamento. Embora o art. 215 do Código Civil disponha que a escritura pública faz prova plena, como estudamos em nossa seção, ela faz prova com presunção juris tantum, admitindo prova em contrário.
Nesse sentido, o art. 408 do Código de Processo Civil dispõe:
Art. 408. As declarações constantes do documento particular escrito e assinado ou somente assinado presumem-se verdadeiras em relação ao signatário.
Parágrafo único. Quando, todavia, contiver declaração de ciência de determinado fato, o documento particular prova a ciência, mas não o fato em si, incumbindo o ônus de prová-lo ao interessado em sua veracidade.
No mesmo sentido, o art. 215 do Código Civil assim interpreta a jurisprudência:
RECURSO ESPECIAL. PREQUESTIONAMENTO. SÚM. 211/STJ. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. AUSÊNCIA. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E COMPENSAÇÃO DE DANO MORAL. PAGAMENTO MEDIANTE CHEQUES. RECIBO DE QUITAÇÃO. TÍTULOS DE CRÉDITO EMITIDOS PRO SOLUTO. ÔNUS DA PROVA DO NÃO PAGAMENTO. JULGAMENTO: CPC/15. 1. Ação de rescisão contratual c/c indenização por danos materiais e compensação de dano moral ajuizada em 06/05/2015, da qual foi extraído o presente recurso especial, interposto em 22/08/2017 e atribuído ao gabinete em 13/03/2018. 2. O propósito recursal é decidir sobre a negativa de prestação jurisdicional e sobre o ônus da prova do pagamento realizado mediante a emissão de cheques. 3. A ausência de decisão acerca do dispositivo legal indicado como violado impede o conhecimento do recurso especial (súm. 211/STJ). 4. Devidamente analisadas e discutidas as questões de mérito, e suficientemente fundamentado o acórdão recorrido, de modo a esgotar a prestação jurisdicional, não há falar em violação do art. 1.022 do CPC/15. 5. Em regra, a emissão do título de crédito é pro solvendo, isto é, a simples entrega do título ao credor não significa a efetivação do pagamento. No entanto, terá natureza pro soluto quando emitido e entregue ao beneficiário visando extinguir a obrigação que gerou a sua criação, ou seja, quando dado em pagamento da relação causal. 6. O recibo que certifica a quitação gera, em favor do devedor, a presunção relativa (juris tantum) do pagamento, de tal modo que, se, em momento posterior, o credor percebe que parte do pagamento ainda se encontra em aberto, poderá buscar a diferença, mas terá o ônus probatório de impugnar a quitação que emitira anteriormente. 7. Recurso especial conhecido em parte e, nessa extensão, desprovido. (STJ - REsp: 1745652 RS 2018/0025373-0, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 10/12/2019, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 13/12/2019)
CIVIL E PROCESSO CIVIL. JULGAMENTO EXTRA PETITA. INOCORRÊNCIA. QUITAÇÃO DADA EM ESCRITURA PÚBLICA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. PRESUNÇÃO RELATIVA DE PAGAMENTO. ARTS. ANALISADOS: 460, CPC; 215, CC/02. 1. Ação declaratória de nulidade de negócio jurídico c/c reivindicatória, distribuída em 09/08/2007, da qual foi extraído o presente recurso especial, concluso ao Gabinete em 28/11/2013.
2. Discute-se se o julgamento proferido pelo Tribunal de origem é extra petita, bem como se a quitação dada em escritura pública de compra e venda de imóvel gera presunção absoluta do pagamento.
3. A conclusão do Tribunal de origem - de que o negócio jurídico é anulável por vício resultante de erro e dolo - decorreu dos fatos que fundamentaram o pedido inicial, de modo que não há falar em julgamento extra petita.
4. A presunção do art. 215 do CC/02 implica, de um lado, a desnecessidade de se provar os fatos contidos na escritura pública, à luz do que dispõe o art. 334, IV, do CPC, e, de outro, a inversão do ônus da prova, em desfavor de quem, eventualmente, suscite a sua invalidade.
5. A quitação dada em escritura pública gera a presunção relativa do pagamento, admitindo a prova em contrário que evidencie, ao fim e ao cabo, a invalidade do instrumento em si, porque eivado de vício que o torna falso. (G.N.)
6. Recurso especial conhecido e desprovido. (REsp 1438432/GO, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 22/04/2014, DJe 19/05/2014)
Com relação à prova testemunhal, considerando o disposto no parágrafo único do art. 227 do Código Civil, é admitida a produção de prova testemunhal em relação ao negócio jurídico e à forma como foi pactuado, independentemente do valor do negócio jurídico. Assim, através das testemunhas e da demonstração de ausência de pagamentos em sua conta corrente, Evandro pode ajuizar a ação cabível para receber os valores de José Rolo ou para rescindir o negócio, pela ausência de pagamento.