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sem medo de errar
Como aluno de Direito, você deve classificar os bens envolvidos na situação da pequena cidade do interior de São Paulo, em que o prefeito construiu um centro cultural com uma biblioteca e um estacionamento. Para respondermos à nossa situação-problema, devemos classificar os seguintes bens: o centro cultural, a biblioteca, os livros e os carros, considerados em si mesmos e quanto ao titular do domínio.
Quanto à tangibilidade, o centro cultural, a biblioteca, os livros e os carros são bens corpóreos, uma vez que corpóreos são aqueles bens que têm existência material, ou seja, aqueles que podemos tocar.
Quanto à mobilidade, os carros e os livros são bens móveis, uma vez que se encaixam na definição do art. 82 do Código Civil: “São móveis os bens suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção por força alheia, sem alteração da substância ou da destinação econômico-social” (BRASIL, 2002, [s.p.]). Assim, esses bens podem ser transportados sem alterações.
Os bens móveis são subdivididos em: por natureza, por antecipação e por determinação legal. O livro e o carro são móveis por natureza, e são móveis propriamente ditos, uma vez que são movidos por força alheia.
O centro cultural e a biblioteca municipal são bens imóveis, uma vez que não poderão ser transportados sem que se altere sua substância.
Os bens são imóveis por natureza ou essência, por acessão física industrial ou artificial ou por acessão física intelectual ou por determinação legal. O centro cultural e a biblioteca municipal são imóveis por acessão física industrial artificial, porque foram imobilizados por atuação humana concreta e efetiva (artificial), pois são construções.
Quanto à fungibilidade, teremos que fazer uma distinção entre os livros comuns e os livros raros citados na situação.
Os bens infungíveis não podem ser substituídos por outros da mesma espécie, qualidade e quantidade. Na nossa situação, são: o centro cultural, a biblioteca e os livros raros. Já os bens fungíveis são aqueles que podem ser substituídos por outros da mesma espécie, qualidade e quantidade, portanto os livros que não são especiais são assim classificados.
Quanto à consuntibilidade, o centro cultural, a biblioteca, os livros e os carros podem ser classificados como bens inconsumíveis, uma vez que podem ser utilizados reiteradas vezes, sem que fiquem danificados imediatamente.
Quanto à divisibilidade, o centro cultural, a biblioteca, os livros e os carros são bens indivisíveis, pois não podem ser divididos sem desvalorização ou dano.
Quanto à individualidade dos bens, o centro cultural e a biblioteca são bens coletivos, pois em conjunto formam um todo homogêneo. Já os livros e os carros são singulares, porque são considerados por si mesmos, independentemente dos demais.
Quanto ao titular do domínio, os bens podem ser particulares (ou privados) ou públicos (ou do Estado). O centro cultural, a biblioteca e os livros da biblioteca são bens públicos, uma vez que são de domínio público e pertencem à pessoa jurídica de direito interno.
Os bens públicos podem ser classificados em: bens de uso geral ou comum do povo, bens de uso especial e bens dominicais ou dominiais. O centro cultural, a biblioteca e os livros da biblioteca são bens de uso geral ou comum do povo, pois podem ser usados por todos indistintamente.
Finalmente, os carros que ficam no estacionamento são classificados como bens particulares, visto que pertencem às pessoas privadas que visitarem a biblioteca.
Avançando na prática
A casa de Maria
Maria está com muitas dívidas e não tem como pagá-las. Para cobrança de uma das dívidas referente a um carnê da loja de roupas, foi ajuizada ação de cobrança contra ela. A ação foi julgada procedente e na fase da execução de sentença foi decretada a penhora do apartamento em que Maria reside.
Salienta-se que referido imóvel, localizado no centro da cidade, é o único de sua propriedade, onde reside há 15 anos. Dentro da casa, os móveis são simples e não possuem nenhum luxo, sendo o necessário e suficiente para sobreviver com dignidade.
Ainda, é importante destacar que Maria é solteira, não tem filhos e mora sozinha no imóvel. Atualmente, ela sobrevive com rendimento mensal de um salário-mínimo, proveniente de seu trabalho como balconista.
Até então, Maria não tinha advogado constituído nos autos. No entanto, desesperada com a penhora da sua casa, ela lhe procura como advogado, buscando informações sobre a possibilidade ou não de perda do referido imóvel.
Para solucionar esta situação-problema, lembre-se de que o bem de família está regulamentado pela Lei nº 8.009/90, a qual considera automaticamente inalienável e impenhorável o bem de família.
Aluno, como advogado, você deve resolver o caso hipotético de Maria, a qual, em ação de cobrança, teve sua casa penhorada. O apartamento em que ela reside sozinha é o único imóvel de sua propriedade. Assim, para solucionar o caso, você deverá lembrar-se do que aprendemos sobre o bem de família.
O bem de família é legalmente inalienável. Pode ser voluntário, quando instituído por ato de vontade e por escritura pública ou testamento, para destinar parte do patrimônio em bem de família, surgindo a partir daí dois efeitos: a impenhorabilidade e a inalienabilidade.
Contudo, o bem de família também pode ser legal, ou seja, sua proteção pode decorrer da lei. O bem de família legal tem proteção automática e é regulado pela Lei nº 8.009/90 (BRASIL, 1990). Neste caso, há a impenhorabilidade do bem, porém não há a inalienabilidade.
A lei considera como impenhorável, de forma automática, o imóvel destinado à residência da entidade familiar. O fundamento para a proteção do bem de família é a dignidade da pessoa humana, o direito social à moradia, à proteção à família e à entidade familiar. Assim, determina o art. 1º Lei nº 8.009/90:
Art. 1º. O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei.
Parágrafo único. A impenhorabilidade compreende o imóvel sobre o qual se assentam a construção, as plantações, as benfeitorias de qualquer natureza e todos os equipamentos, inclusive os de uso profissional, ou móveis que guarnecem a casa, desde que quitados.
O bem de família é protegido, tornando-se impenhorável, assim como os móveis que guarnecem a casa. No caso da presente situação hipotética, Maria possui um único imóvel e reside nele, e dentro deste apenas existem móveis simples, essenciais para sua sobrevivência.
Se não bastasse, ela é solteira, devendo-se lembrar que nossos Tribunais têm entendido que o conceito de impenhorabilidade de bem de família abrange também o imóvel pertencente a pessoas solteiras. Inclusive, o STJ editou a Súmula nº 364 sobre o assunto: “O conceito de impenhorabilidade de bem de família abrange também o imóvel pertencente a pessoas solteiras, separadas e viúvas” (BRASIL, 2008, [s.p.]). Dessa forma, o imóvel em que Maria reside é o único de sua propriedade e, por isso, é impenhorável, nos termos da Lei nº 8.009/90 (BRASIL, 1990).